O início de tudo
Minha trajetória na Medicina foi percorrida com muita persistência, o substantivo que talvez me defina com bastante propriedade.
Desde criança, sempre gostei de cuidar de brinquedos quebrados, e o ambiente hospitalar era familiar, pois meu pai, apesar de ser dentista, trabalhou no Hospital Brigadeiro, local que eu adorava frequentar.
Durante o segundo colegial, a escrita me destacava, e alguns professores sugeriam o caminho da Filosofia, porém, havia em mim um dilema com a Música, Biologia e Química. Uma decisão difícil.
Não tive muito tempo para pensar, pois, aos 17 anos, parti de São Paulo rumo à Faculdade de Medicina de Botucatu. Sair da capital e estudar no interior para ser médica era um feito raro na época para alguém tão jovem e, ainda por cima, mulher. A adaptação foi difícil: novas pessoas, costumes conservadores, uma faculdade ainda em crescimento – e do interior -, mas lá estava a persistência. Meu sonho, naquela época, era ser geneticista.
Formei-me na nona turma de Botucatu e tenho muito orgulho de ter sido parte de uma universidade que está hoje entre as mais disputadas, criada por profissionais jovens com muita garra, boa parte advinda da Escola Paulista de Medicina (EPM/Unifesp) e da Universidade de São Paulo (USP) e com o sonho de construir uma grande Escola.
O encanto
E foi no segundo ano que me encantei pela Medicina, por intermédio da Dra. Norma Gerusa da Silva Mota, que lecionava Imunologia. Dedicação, persistência e, no quarto ano, estava já estudando e fazendo pesquisa em Endocrinologia.
Minha primeira pesquisa na área foi sobre hipertireoidismo, e me sinto honrada pelo Dr. Antonio Carlos Carneiro ter acreditado em mim e ser meu mentor. Cheguei a pensar em seguir Obstetrícia, uma área que também me encanta, mas foi por causa do Dr. Carneiro que, finalmente, decidi seguir a Endocrinologia, área que une duas de minhas paixões: a Imunologia e a Genética, e que cuida do desenvolvimento desde o ventre da mãe até a vida adulta.
Fiz residência em Clínica Médica ainda em Botucatu, complementada com formação em Endocrinologia na Escola Paulista de Medicina (EPM/Unifesp).
Fui uma das primeiras pessoas de faculdade do interior a concluir mestrado em Endocrinologia Clínica na Unifesp (na época, Escola Paulista de Medicina). Como um tributo pela minha admiração em Obstetrícia, minha tese foi sobre diabetes e gestação. Tive o prazer de conviver com uma grande equipe de doutores, entre eles: Maria Nice Kulay, Dib-El Kadre, Geraldo Paraventi e Pedro Luiz Lacordia.
Por ter trabalhado com gestantes, havia sempre um foco no recém-nascido. E durante minha trajetória, percebi que estava sempre indo ao lado da criança… fui sentindo que era desconfortável trabalhar com o paciente adulto, dizendo o que ele deveria ou não fazer com sua saúde, o que comer ou não. Tratar apenas a doença nunca foi meu foco: sempre gostei do processo como um todo, saber o que é possível fazer antes de tudo e dar melhores diretrizes no processo de crescimento físico e emocional dos pacientes.
Trabalhar com crianças sempre foi mais motivador
Enquanto trabalhava no Hospital Santa Marcelina, aos 27 anos, terminei o mestrado e parti para uma das experiências mais desafiadoras da minha vida: o treinamento em Endocrinologia Pediátrica no Johns Hopkins Hospital (Maryland, Estados Unidos), que tem serviços de referência em doenças genéticas e endocrinológicas, como ambiguidade sexual e distúrbios puberais, entre outras. Naquela época, sem os recursos tecnológicos de comunicação que temos hoje e num país com uma cultura tão diferente da nossa, foi uma experiência única estar onde começou a história da Endocrinologia Pediátrica.
Sou movida a novos projetos e novas ideias
De volta ao Brasil em 1984, após uma série de readaptações, organizei o Serviço de Endocrinologia Pediátrica na EPM/Unifesp, onde ainda trabalho. O apoio de alguns colegas endocrinologistas foi muito importante nesse processo, entre os quais, Dr. Gil Guerra e Dr. Osmar Monte, entre outros.
Determinada em seguir a carreira acadêmica, parti para o doutorado em Pediatria e Ciências Aplicadas à Pediatria pela Universidade Federal de São Paulo, curso que veio a ser concluído em 1993, quando eu já era mãe. O Prof. Dr. Dalton Soares foi um grande amigo, presente nas horas mais difíceis com seus ensinamentos, paciência e compreensão, além de colega de consultório por 10 anos.
A perspectiva do desenvolvimento é fascinante
Depois de atuar 14 anos no A.C. Camargo com atendimento especial às crianças portadoras de câncer, senti que era preciso fazer algo por elas, já que o tratamento deixa sequelas profundas. Foi quando criei o Serviço de Endocrinologia no Graac (Instituto de Oncologia Pediátrica/Graacc/Unifesp).
Fui trabalhar lá para aprender, dar valor ao abraço, à vida, às coisas pequenas, ao olhar o outro... encontrei uma área de grande satisfação.
Hoje, sou muito realizada
Novos projetos estão por vir, sempre. Afinal, sou persistente e movida por ideias.